Há indicações nos textos de João
Cassiano (Instituições monásticas), Pacômio (Regra Monástica), que mostram que os Pais do deserto acolheram entre si
adolescentes e até mesmo crianças. Estes jovens recebiam basicamente uma
educação moral e ascética, era muito mais uma formação espiritual do que
intelectual. Inicialmente o monaquismo restaurou na tradição cristã o “primado
dos simples”, opondo-se ao orgulho intelectual próprio da cultura clássica, às
tendências gnósticas e alexandrinas que ameaçavam, no século III, sufocar a
simplicidade evangélica.
Ainda que a simplicidade fosse a
tônica, naturalmente foi-se afirmando um caráter douto no monasticismo devido
ao imperativo estudo das Escrituras. No Oriente era normal conhecê-las de cor e
para isso era necessário lê-las. Pacômio, em sua Regra (320-340), prescreve que
se um ignorante entra em um mosteiro deveria receber inicialmente vinte salmos
e duas epístolas para aprender. Se não soubesse ler receberia lições à razão de
três horas por dia. Todos no mosteiro deveriam saber ler e aprender de cor, no
mínimo, todos os Salmos e o Novo Testamento. (p. 503)
Na Regra de São Basílio as
crianças, apresentadas por seus pais, eram aceitas e iniciadas nas letras com
vistas ao estudo da Bíblia. Uma vez assimilado o silabário, aprendia-se a ler
nomes isolados, depois máximas e em seguida pequenas histórias. E assim eram
usados nomes de personagens bíblicos, versículos do Livro dos Provérbios e
histórias santas.
Por volta de 375, João
Crisóstono, tentou persuadir os pais cristãos a transferirem a educação de seus
filhos, a partir dos dez anos de idade, aos monges dos desertos vizinhos de
Antioquia. Sua intenção era formar um caráter cristão puro e cristalino nos
jovens, implementar uma vida virtuosa cristã. Os rapazes deveriam permanecer
dez anos, vinte se necessário. Percebendo os problemas dessa postura o próprio
Crisóstono mudou de ideia e insistirá na obrigação dos pais em educar seus
filhos à maneira cristã. (p. 505)
Em 451, o Concílio de Calcedônia
interditou formalmente a educação, nos monastérios, de crianças que voltariam
para o mundo (paides kosmikoi). O que
comprometia a paz e o recolhimento próprio da vida monástica.
No Ocidente, carente da lembrança
nostálgica dos mestres iletrados da primeira geração monástica, o monasticismo
desenvolveu outros matizes. A lectio
divina esteve sempre ligada ao bom exercício da vida monástica. Desde muito
cedo o monasticismo ocidental teve um marcante caráter letrado.
Santo Agostinho, em sua Regra,
prevê como normal a existência de uma biblioteca no monastério. Os monges de
São Martinho, iniciador do monasticismo na Gália, copiavam manuscritos. São
Patrício, evangelizador da Irlanda, quando lhe traziam um jovem para se tornar
monge ele o batizava e lhe dava um alfabeto. (p. 507)
A partir do século VI as
exigências monásticas se tornam maiores, se tornando imprescindível a todo
monge ou freira saber ler e de entregar-se à leitura sagrada. A Regra de São
Cesário de Arles (534), direcionada para mulheres, prescreve que se deveria
admitir crianças a partir dos seis ou sete anos e que fossem capazes de
aprender as letras. Todas as religiosas deveriam aprender a ler, consagrando
duas horas diárias à leitura, e também copiariam manuscritos. (p. 507)
Praticamente todas as demais
regras monásticas prescrevem a lectio
divina. E toda essa preocupação com o letramento dos religiosos alcançará
expressão ainda mais ampla a partir da Regra de São Bento (c. 525 d.C.). (p.
508)
referência: MARROU
H. História da educação na antiguidade.
São Paulo: Herder, 1966.
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